SOBRE
Inflexão
Margot Delgado vive envolta em apontamentos, poemas e reflexões. Não por acaso em um de seus cadernos ela transcreveu em inglês um trecho do poema Ítaca, de Konstantinos Kaváfis, aqui em tradução de José Paulo Paes: “Tem todo o tempo Ítaca na mente. / Estás predestinado a ali chegar. / Mas não apresses a viagem nunca. / Melhor muitos anos levares de jornada / e fundeares na ilha velho enfim, / rico de quanto ganhaste no caminho, / sem esperar riquezas que Ítaca te desse”.
Em suas andanças, sob os céus do mar ou do sertão, Margot fotografa nuvens, como protagonista de sua viagem, sem pressa de chegar. Desde os anos 1980, as nuvens preenchem páginas de pequenos cadernos e inspiraram uma primeira aquarela. O assunto também virou pintura e se ampliou até render uma instalação em 1993, em que um céu aquarelado de 6 metros quadrados ocupava todo o vão do prédio da Santa Marcelina.
O que ela mostra agora são sequências de imagens captadas pela máquina fotográfica e migradas para 16 pequenas matrizes de cobre. Essas fotogravuras, em várias gradações de negro, foram impressas em papel de arroz japonês feito à mão, uma seguindo a outra como uma linha no horizonte, fotogramas de um documentário em preto e branco. Outra série menor foi tingida por amarelos solares. O suporte sutil mostra-se digno dessas massas efêmeras, em constante transformação.
Na impressão, as matrizes são às vezes sobrepostas, as posições trocadas, criando indefinições, áreas de sombra, imagens infletidas. Os recursos da técnica servem ao interesse da artista em relativizar o foco, em criar certa fricção entre o ser e o nada, confundindo o olhar que ora vê nuvens, ora marés ou rochas. Margot pode partir do real, mas o transforma em realidades escorregadias, encobertas por véus que suspendem as certezas. Para ela, “a representação é um mistério” e o trabalho se faz sobre a gama dos sentimentos do outro.
Seu tempo é elíptico, volta-se frequentemente ao passado, a elaborações anteriores, para retomar ideias e deixá-las novamente em aberto. Não é só uma maneira de refletir sobre o caminho já percorrido, mas de acenar com outras possibilidades. Para isso ela se utiliza de velaturas, entonações, inflexões, que, como ensina o dicionário, são “desvios da posição normal”.
Nas vitrines desta exposição estão fotografias que Margot fez de trabalhos anteriores, às vezes recortes, colagens ou detalhes ampliados, e que foram impressas em papel Hahnemühle, usando para isso os recursos de máquinas copiadoras. Ao lado dessas delicadas manchas poéticas, desenhos, aquarelas e poemas contam um pouco da natureza da artista e de seu processo de criação. Amorosamente atenta à vida e às suas manifestações, seu balé sugestivo de nuvens envolve a todos os viajantes solitários, predestinados a chegar.
Em um dos trabalhos, oculta por um véu branco, pode-se ler a palavra “saudade”. Na pequena aquarela, o vão entre as criaturas em negro é quase um grito e em um de seus poemas ela pede: ”você pode me dizer uma vez mais / aquelas palavras que me faziam / voar?”.
Vera d’Horta / março 2015

OBRAS

























Formação
FORMAÇÃO EM ARTES PLÁSTICAS
1970 Faculdade de Belas Artes de São Paulo
Curso de Licenciatura em Desenho e Plástica - 1º Ano
1974/77 Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo
Atelier de Gravura com Evandro Carlos Jardim - Aluna convidada.
1975 Curso de Monitores da Fundação da Bienal de São Paulo
Curso de Aquarela com Ubirajara Ribeiro
1976/77 Fundação Armando Álvares Penteado
Atelier de Gravura com Evandro Carlos Jardim
1976 Fundação Armando Alvares Penteado
Curso de Desenho com Alice Prado e José Resende
1991/92 Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo
Desenho da Paisagem e Figura Humana com Evandro Carlos Jardim - Ouvinte.
1993/94 Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo
Atelier de Gravura Francesc Domingues com Evandro Carlos Jardim
1996 SENAC - Curso de Suprimento / Aperfeiçoamento Workshop: “Ocupação”....José Resende
1998 Curso de História da Arte com Rodrigo Naves
1998 Museu de Arte de São Paulo
Curso de História da Arte - Giotto com Luis Martins
1999 SESC Pompéia
Arte em Movimento - Pintura com Manuel Fernandes
INFORMAÇÕES
Exposições Individuais
EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS
2006 Galeria Gravura Brasileira
“Transparências” – Gravura e Desenho.
1999 Galeria Espaço Azul
“O Rosto Humano” - Óleo em bastão.
1999 Livraria Cultura
“Objetos Flamejantes” – Cera
1994 Museu de Arte Contemporânea de São Paulo
Atelier de Gravura Francesc Domingo
“Prova de Artista” - Desenho, gravura, aquarela e pintura.
1989 Paulo Figueiredo Galeria de Arte
“Ar e Luz” – Instalação
1988 Temple University - Interamerican Studies Center
Gravuras
1988 University of Pennsylvania - Art Department
Gravuras
1988 Brazilian American Cultural Institute - Washington DC.
Gravuras e Aquarelas
1986 Galeria do Sol - São José dos Campos
Aquarelas
1985 Paulo Figueiredo Galeria de Arte
“Memória e Invenção” - Gravuras e Aquarelas
1977 Galeria Seta
“A máquina de Costura” - Desenho e Gravura