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Oswaldo Goeldi

rIO DE jANEIRO

1895

SOBRE

Oswaldo Goeldi é conhecido como um dos principais gravuristas brasileiros e é um nome indispensável da primeira geração modernista. Sua produção tem sido objeto de um renovado interesse, graças à originalidade de seu vocabulário expressionista, que representa um contraponto ao modernismo hegemônico no Brasil. Ao longo dos mais de 40 anos de sua carreira, o artista produziu em meios como xilogravura, litogravura, desenho e ilustração, desenvolvendo uma relação fértil com o mercado editorial, ao ilustrar obras literárias de autores como Dostoievski e Raul Bopp, além de produzir para inúmeras revistas e jornais.

Os trabalhos de Oswaldo Goeldi se destacam pela amplitude de interesses e pela profundidade das questões apresentadas. O artista foi hábil em incorporar os signos da vida urbana, no campo da xilogravura, de modo a configurar uma linguagem singular. A cidade goeldiana é elaborada a partir de uma escala humana, em que se acentua menos a dimensão labiríntica das grandes metrópoles e mais a aparência dos lugares esquecidos, vielas e becos sem saída. Em seu repertório de “imagens-enigmas”, figuram símbolos recorrentes como o guarda-chuva, o chapéu, o lampião, o poste.

A atmosfera densa que deriva de suas paisagens resulta sobretudo da relação entre espaço e figura humana, que desestabiliza toda forma de harmonia, provocando assombro e insinuando enigmas. Goeldi representa personagens à margem, como pescadores, prostitutas, trabalhadores da cidade, entre outras figuras errantes. Para o poeta Carlos Drummond de Andrade, que dedicou um poema ao artista, publicado em livro de 1959, os personagens goeldianos são “criaturas condenadas ao mundo”.

Além disso, Goeldi foi um percursor das experiências cromáticas no campo da gravura. Obras do início de sua carreira, realizadas em 1932, já testam o uso expressivo da impressão em cores, em amarelo e vermelho. A cor é um elemento especial, através do qual atribui à obra um sentido novo, entre o fantástico e o simbólico, tal como o próprio artista define. Ele soube como poucos explorar as qualidades e particularidades da xilogravura.

A produção goeldiana é considerada pela fortuna crítica de uma modernidade exemplar, e profundamente reveladora das contradições decorrentes de seus deslocamentos entre Europa e Brasil. Goeldi nasce no Rio de Janeiro, mas passa a infância em Belém do Pará. Seu pai é Emilio Augusto Goeldi, renomado naturalista suíço. Em 1901, Oswaldo Goeldi retorna à Suíça com sua família, onde vive a adolescência e juventude. Seu período de formação começa em 1917, quando ingressa na École des Arts et Métiers de Genebra, e realiza sua primeira exposição em uma galeria em Berna. Ainda em 1917, tem contato com a obra de Alfred Kubin, que exerce grande influência sobre seu estilo. Durante anos, manteve correspondência com o artista austríaco, chegando a integrar seu grupo, Der Blaue Reiter, um dos mais representativos do expressionismo alemão.

Em 1919, Goeldi retorna definitivamente ao Brasil e passa atuar como ilustrador em diversas revistas. Dois anos depois, realiza sua primeira exposição no Liceu de Artes e Ofícios, evento que desperta a atenção de escritores como Manuel Bandeira e Raquel de Queiroz, além de comentários elogiosos de Di Cavalcanti. Na década de 1930, cria o álbum 10 Gravuras em Madeira. Nesses anos e na década seguinte, produz para o jornal A manhã e para a editora José Olympio, tornando-se conhecido pelo grande público como ilustrador.

O reconhecimento do pioneirismo de sua linguagem em gravura se consolida em 1950, ano em que expõe na 25ª Bienal de Veneza, e em 1951, quando recebe o grande prêmio de gravura da 1ª Bienal de São Paulo. Obras de Oswaldo Goeldi hoje integram o acervo das principais instituições brasileiras e de importantes coleções internacionais, entre elas: Pinacoteca do Estado de São Paulo, São Paulo; MAM São Paulo, MAC USP, São Paulo; MASP, São Paulo; MAM Rio de Janeiro; Museu Nacional de Belas Artes - MNBA, Rio de Janeiro; Fundação Edson Queiroz, Fortaleza; Landesmuseum, Linz, Áustria e Essex Collection of Art from Latin America - ESCALA, Colchester, Reino Unido, entre outras.

Oswaldo Goeldi
SOBRE
OBRAS
OBRAS
EDU, CV, EXTRAS
Bio

Filho do cientista suíço Emílio Augusto Goeldi. Com apenas 1 ano de idade, muda-se com a família para Belém, Pará, onde vivem até 1905, quando se transferem para Berna, Suíça. Aos 20 anos ingressa no curso de engenharia da Escola Politécnica, em Zurique, mas não o conclui. Em 1917, matricula-se na Ecole des Arts et Métiers [Escola de Artes e Ofícios], em Genebra, porém abandona o curso por julgá-lo demasiado acadêmico. A seguir, passa a ter aulas no ateliê dos artistas Serge Pahnke (1875 - 1950) e Henri van Muyden (1860 - s.d.). No mesmo ano, realiza a primeira exposição individual, em Berna, na Galeria Wyss, quando conhece a obra de Alfred Kubin (1877 - 1959), sua grande influência artística, com quem se corresponde por vários anos. Em 1919, fixa-se no Rio de Janeiro e passa a trabalhar como ilustrador nas revistas Para Todos, Leitura Para Todos e Ilustração Brasileira. Dois anos depois, realiza sua primeira individual no Brasil, no saguão do Liceu de Artes e Ofícios. Em 1923, conhece Ricardo Bampi, que o inicia na xilogravura. Na década de 1930, lança o álbum 10 Gravuras em Madeira de Oswaldo Goeldi, com introdução de Manuel Bandeira (1886 - 1968), faz desenhos e gravuras para periódicos e livros, como Cobra Norato, de Raul Bopp (1898 - 1984), publicado em 1937, com suas primeiras xilogravuras coloridas. Em 1941, trabalha na ilustração das Obras Completas de Dostoievski, publicadas pela Editora José Olympio. Em 1952, inicia a carreira de professor, na Escolinha de Arte do Brasil, e, em 1955, torna-se professor da Escola Nacional de Belas Artes - Enba, no Rio de Janeiro, onde abre uma oficina de xilogravura. Em 1995, o Centro Cultural Banco do Brasil realiza exposição comemorativa do centenário do seu nascimento, no Rio de Janeiro.

INFORMAÇÕES

"Os horizontes infinitos que se abriram para mim ao contemplar a abundância dos seus [Kubin] trabalhos - 1930 na minha tão curta visitinha a Wernstein - e as palavras bondosas que o senhor me dirigiu obrigam-me a ser-lhe eternamente grato. O que na ocasião me pareceu novo, nos seus trabalhos, era  o comovente - a emoção que transmitem, ao contrário de outras criações, que nos agradam mais pelo seu alcance. Não sei se consegui me fazer entender. Foi uma experiência fortíssima para mim. Alguns dos trabalhos de Munch, e, principalmente, os desenhos de Van Gogh me falam intimamente. Nos trabalhos de Van Gogh sente-se o nervo exposto, dolorido, mas me agradam muito. Porém, ninguém tem como o senhor esta envergadura, esta riqueza; ninguém exprimiu tão fortemente o seu eu mais íntimo - isto eu digo sem entusiasmo cego".
Oswaldo Goeldi - Rio, 8 de maio de 1933
GOELDI, Oswaldo. Correspondência a Alfred Kubin (Rio, 8/05/1933). In: RIBEIRO, Noemi Silva (Org.). Oswaldo Goeldi: um auto-retrato. Rio de Janeiro: Centro Cultural Banco do Brasil, 1995. p. 170.




"Fala-se muito hoje em inovações, em abrir caminhos, etc...Mas não se deve confundir experimentos técnicos com a verdadeira inovação. Todo artista realmente criador inova, e isso porque ele amplia seus meios técnicos na proporção de suas necessidades de expressão. Só essa inovação é legítima - a inovação que é ditada por uma necessidade interior. Inovar por inovar não tem sentido. Sei de artistas que passaram a vida toda inovando e não puderam fazer mais que "inovações"... Na verdade, muitas inovações em metal datam de 1950. Por outro lado, há exemplos de gravadores, como Jacques Villon, que, partindo da técnica tradicional, fizeram a passagem para uma maior síntese de formas, sem abandonar o verdadeiro sentido da gravura. Houve sempre na carreira de Villon um sábio equilíbrio entre técnica e criação sempre mais em profundidade. Villon é um verdadeiro clássico da gravura moderna. Outro que se pode colocar ao lado dele é Lionel Feininger com suas xilos e suas águas-fortes. Mas ponha-se uma gravura de Friedlander ao lado de uma de Villon: a de Friedlander some. Enfim, desde que artifícios e truques substituíram a gravura, não há mais propósito dizer se a gravura é boa ou má".
Oswaldo Goeldi
GOELDI, Oswaldo. In: BRITO, Ronaldo; ROESLER, Sílvia (coord.). Oswaldo Goeldi. Rio de Janeiro: Instituto Cultural The Axis, 2002. 228 p., il. p&b color. p. 208. [Entrevista de Oswaldo Goeldi a Ferreira Gullar para Jornal do Brasil, 12 de janeiro de 1957]

texto crítico

"Abandono e esquecimento formam o eixo do trabalho de Goeldi; latas derrubadas, cães vadios, móveis ao relento. No entanto, pelo fato mesmo de não serem lembradas, as coisas parecem aqui ainda preservadas da mesquinhez, cheias de mistério e de potência. Aquilo que foi deixado de lado está inteiro, pronto para ser acionado, e o vento que bafeja essas gravuras quer acordar os homens, bichos, lugares, chamando-os à vida. Sua afeição, no entanto, não pode ter a solidez e clareza objetiva de quem os esqueceu. Daí o crepúsculo contínuo e sempre renovado desses trabalhos.

(...) No entanto, encantamento e suspensão caracterizam também essas gravuras e desenhos. Isso vem, creio, da intensa analogia formal entre seus elementos. Cheios são vazios, casas são ruas, urubus são guarda-chuvas, as janelas nos olham. Tudo é meio assemelhado a tudo, bafejado pelo mesmo sopro de vida, as formas ecoando discretamente umas nas outras, como se ainda não tivesse se formado de todo. Essa individuação incompleta faz grande parte da originalidade de Goeldi, e permite que as distorções expressionistas que o influenciaram abdiquem de seu desespero. O mundo de Goeldi é um mundo em suspensão, seus habitantes ainda despertam e se procuram, e se caminham para a morte o fazem solidariamente. Daí a calma de sua tristeza, onde abandono e comunhão convivem".
Nuno Ramos
RAMOS, Nuno. Para Goeldi. São Paulo: AS Studio,1996. p. 17-18.

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