top of page
Silvia Ruiz

São Paulo

1978

SOBRE

Em seu livro Cidades Invisíveis, o escritor cubano Italo Calvino começa dizendo: Não se sabe se Kublai Khan crê em tudo o que diz Marco Pólo quando este lhe conta sobre as cidades visitadas em suas missões diplomáticas, mas o imperador dos tártaros certamente continua a ouvir o jovem veneziano com maior curiosidade e atenção, mais que qualquer outro de seus enviados ou exploradores.
E assim começa uma relação entre Kublai Khan, que se encontra encerrado nas muralhas do seu vasto império, e o explorador Marco Pólo, que a cada viagem descreve, segundo suas memórias, cidades maravilhosas com teatros de cristal, galos de ouro ou ainda outras, por vezes melancólicas, onde a população, presa em uma espécie de memória da juventude, vê os seus desejos transformados apenas em recordações, e ainda uma que se duplica e perde-se no seu próprio reflexo, olhando-se sempre olho no olho, mas sem um envolvimento profundo.
São com temas levantados pelo escritor cubano como a memória, o desejo por explorar novas paradas e os seus símbolos, que o trabalho da artista Silvia Ruiz opera, nos remetendo a problematizações semelhantes em sua série Passagens.
Através da pesquisa que se inicia em 2010, a artista em suas próprias andanças passa a reunir uma série de acessos existentes como portas, janelas, arquiteturas abandonadas, mas que já não se abrem para o mundo exterior, perdendo assim sua função de nos convidar a entrar fisicamente nos espaços construídos em torno deles, sejam esses uma capela em Praga, um castelo na cidade de Sintra em Portugal ou até mesmo uma porta de uma construção decadente em Ouro Preto, Minas Gerais.
A série Passagens toma corpo em 2014, com um repertório particular de lugares. A artista começa a transformar as imagens adquiridas ao longo de suas viagens em gravuras, explorando em seus trabalhos grandes dimensões, e lidando na confecção dos mesmos com a ação do tempo e resgate da sua própria memória afetiva.
Esses espaços encerrados capturados por Silvia Ruiz de fato passam a nos interessar. O intervalo em que nos detemos diante dessas passagens, o trânsito da memória, são as provocações que a artista parece nos propor, estimulando e nos convidando a reorganizar um espaço extinto, entrando com o nosso próprio repertório de vida nesse hiato de tempo diante dos trabalhos expostos.

ALEXANDRE LOPES - 2016 Curador independente e crítico de arte.
Texto escrito para exposição: Passagens/Pasajes na Galeria do Instituto Cervantes, SP.

Silvia Ruiz
SOBRE
OBRAS
OBRAS
EDU, CV, EXTRAS
Bio

Pós-graduada em Arte: Crítica e Curadoria pela Pontifícia Universidade Católica, PUC - 2012 e Licenciada em Artes Visuais pela Universidade Estadual Paulista, Unesp - 2002. Frequentou workshops de fotogravura e gravura em metal sob orientação de  Sheila Goloborotho e Cláudio Mubarac, no Museu Lasar Segall em São Paulo. Consolidou sua formação em gravura no Atelier Graphias, sob orientação de Salete Mulin. Foi contemplada, em 2016, com uma bolsa na Fundacíon CIEC - "Centro Internacional de la Estampa Contemporânea", em La Corunã, no Programa !Intercâmbio Artístico" do MINC para estudar e desenvolver a técnica da litogravura. Busca apronfudar as intersecções entre gravura e arte contemporânea, transpondo técnicas tradicionais para meios tridimensionais, apresentando resultados em diferentes suportes e instalações. Atua como gravadora, educadora e ministrante de oficinas e cursos de arte em Instituições como SESC, SESI, Centro Cultural do Alumínio, entre outras. Desde 2002 tem participado de várias Exposições Coletivas, Bienais e Salões de Arte Contemporânea no Brasil e Exterior. Suas gravuras estão presentes no acervo da Pinacoteca do Estado de São Paulo, Pinacoteca de São Bernardo do Campo/SBC, Casa da Xilogravura em Campos de Jordão, MARP Ribeirão Preto, Museu de Arte Contemporânea de Campo Grande/MS entre outros. Atualmente é representada pela Galeria Gravura Brasileira e Trapézio Galeria.

INFORMAÇÕES
texto crítico

Paisagem Impressa

A pesquisa poética de Silvia Ruiz se desenvolve principalmente a partir da experiência com a gravura. Provocativa, a artista une a concepção mais convencional da arte de gravar à natureza experimental da produção contemporânea, esgarça seu horizonte ao mesmo tempo em que a impregna com recursos diversos da criação artística.

Além de impressões obtidas por matrizes, em seus trabalhos encontramos recortes irregulares feitos à mão de papéis diversos, colagens e o uso de tintas, como a aquarela. Estes recursos técnicos somados, possibilitam explorar arranjos, justaposições, sobreposições, texturas; ampliam a utilização de matrizes em estampas de composições diferentes. Torna cada trabalho único, justamente por cada um ser resultado de um processo particular e impossível de ser reproduzido. Dessa forma, a gravura que tem como uma das suas especificidades a possibilidade da reprodução, na elaboração da artista, é subvertida ao limite da unicidade.

Muitos são os temas tratados na obra da artista. Contudo, para essa mostra, a sugestão de vistas naturais, e a paisagem e seus elementos, foi o recorte temático decidido. Assim sendo, montanhas, árvores e nuvens, anunciam-se em cada uma das imagens.

As obras expostas reúnem experimentações com matrizes em linóleo e xilogravura trabalhadas pela artista ou mesmo em estado bruto, nas quais por vezes reconhecemos de imediato os elementos figurados, e em outras lidamos com a sugestão de formações que nos remetem à paisagem. Muito do que observamos nos chega mais pela impressão de ali se constituir uma vista de um espaço natural do que por uma representação específica de uma topografia em particular. Vislumbramos nessas obras possibilidades flutuantes de signos da paisagem.

As técnicas empregadas pela artista geralmente são articuladas para potencializar a experiência da cor e das formas. Manchas translúcidas de aquarela se combinam com papéis artesanais opacos e recortes orgânicos de impressões de sulcos ritmados. Matrizes recortadas em formatos abstratos fluidos, árvores e folhas, são reutilizadas e rearranjadas em posições diversas, propiciando distintos resultados em cada processo.

Na produção das matrizes, o recurso de hachuras é explorado tanto para trazer luz para as formas, rompendo a homogeneidade da cor, como para criar movimento para o olhar observante que transita por sequenciamentos de linhas e traços verticais, horizontais e em outras tantas direções.

A obra de arte, assim como a natureza, nos desperta para a contemplação, para o tempo calmo da apreciação. Os trabalhos de Silvia Ruiz, ao unir sugestão e representação do mundo natural, também nos convidam a olhá-los pausadamente. Olhar para se deixar tocar pelo tempo, se encontrar na natureza, se deslocar em impressões.

PAULO TREVISAN - 2023

Texto escrito para exposição Paisagem Impressa - JB Goldenberg escritório de Arte.

bottom of page